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A rua ensina. Ensina mais do que qualquer relatório, pesquisa ou reunião de gabinete. Mas para ouvir a rua é preciso disposição — disposição para escutar sem roteiro, para abrir mão do conforto e mergulhar na imprevisibilidade do povo. Porque o eleitor comum, aquele que não tem acesso direto ao poder, é justamente o que mais tem a dizer sobre ele.

A política, porém, sofre de uma enfermidade silenciosa: o isolamento. Não o isolamento físico, mas o isolamento relacional — aquele que se forma quando o político se cerca apenas de vozes que concordam, de assessores que filtram, de aliados que moldam a realidade antes que ela o alcance. Essa bolha do entorno é a mais perigosa de todas, mais que a digital, mais que as redes sociais. É uma bolha feita de lealdades excessivas e de verdades confortáveis.

O gabinete, então, torna-se o cemitério dos políticos. É ali que morre o instinto de quem, um dia, soube sentir o povo. É ali que o discurso se transforma em eco — repetido, estéril, distante. O político acredita estar próximo, mas está rodeado de intérpretes. Sua fala deixa de nascer do coração e passa a ser redigida em planilhas, filtrada por conveniências e editada por quem tem medo do confronto com a realidade.

Fora da rua, o político perde o termômetro que mede o calor humano. Passa a governar pelo reflexo — e não pela experiência. A confiança excessiva nos próximos é o primeiro passo para o afastamento dos distantes. E quando o povo se distancia, o poder se esvazia.

Assessoria e gabinete deveriam ser pontes — não muros. Deveriam aproximar, não isolar. Mas quando se tornam filtros, tornam-se túmulos. Túmulos onde jazem lideranças que um dia foram populares, que um dia ouviram a voz do povo, mas que, embaladas pelo conforto do entorno, perderam o tato com a realidade.

O entorno conforta, sim, mas também adormece. Evita o erro, mas também evita o choque com a verdade. E nessa tentativa de proteger, destrói. Porque a política não vive de aplausos internos, vive de contato, de corpo-a-corpo, de olho no olho.

O contato direto é insubstituível. Nenhum relatório traduz o olhar de uma mãe que pede socorro, nenhum gráfico revela o cansaço de um trabalhador, nenhuma reunião de gabinete reproduz o barulho da vida real.

Políticos que se fecham em seus gabinetes acabam sepultados neles — não pela oposição, mas pela própria surdez. Porque o poder, quando deixa de ouvir, deixa de existir.

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